quarta-feira, fevereiro 25, 2009

Séries 30

Boom Festival, Idanha, Portugal, 2004


Ele era um idealista, ou pensava ser. Tinha sérias dúvidas sobre a sua própria ideologia. Nos momentos de introspecção não tinha resposta convincente se o que o movia era uma moda anarquista e esquerdista de oposição ao sistema vigente se era mesmo uma convicção assumida e profunda. Fosse como fosse, sentia-se atraido pela rebeldia e pelo acto de contestação ao sistema.
Não tinha respostas nem alternativas que de facto o convencessem sobre os caminhos que a sociedade deveria trilhar para sair desta espiral que o liberalismo desenfreado a havia colocado. Sentia sim que este caminho não era o seu. Protestava convictamente em todos os eventos que surgiam por esse mundo fora.

Fosse nas marchas antiglobalização, nas manifestações pelos direitos das minorias e das liberdades sexuais, nas manifestações pela libertacao da palestina, do Tibete e de todas as regiões do planeta onde se oprimia a autodeterminação dos povos, nos movimentos ecologistas e nas mais variadas petições sobre os direitos dos animais. Envolvia-se a troco de nada com toda a espécie de ONG que proliferavam como cogumelos em todos os cantos do mundo, daquelas que so se justificam, alimentam, engordam e beneficiam com a desgraça perpétua dos povos ficando para os desgraçados apenas circo de ocasião para justificar todo um sequito da dita ajuda internacional.

O seu ar e o seu modo de vida integrava-se num esteriotipo destes tempos. Rastas, roupas hippies do sec. XXI, saco de plastico com garrafas de alcool que partilhava com os amigos e, obviamente, drogas, de todo o género em todo o género de festas rave.

Nos cada vez mais escassos momentos lucidos que tinha dava por si a pensar que a sua relação com o alcool e as drogas, que todos os circuitos que percorria faziam dele apenas mais um mainstream neste mundo globalizado. Afinal aquilo que pensava que o distinguia do mainstream, a sua consciencia rebelde e antisistema não passava de mais uma instrumentalização criada pelo proprio sistema para lucrar e se perpetuar.

E com este pensamento deprimente e inquietante deciciu tomar uma atitude: tomou de um trago uma garrafa de vodka barato acompanhado com umas trips. Estava pronto para mais uma batalha.

terça-feira, fevereiro 17, 2009

Ambiências 49

Ilha do Sal, Cabo Verde, 2005



Há dias falava da cultura do "estou à pidir" tão caracteristica do povo moçambicano. Falei e disse que a conclusão não era minha era dos proprios moçambicanos.

Já tinha dados de sobra para concordar com eles, mas este fim-de-semana que passou, se dúvidas ainda houvessem, ficaram todas dissipadas.

Venho de carro numa estrada de terra batida que fazia a ligação entre a estrada nacional que liga Maputo ao Norte e a costa, em Zongoene, bem no meio da Provincia de Gaza e perto de Xai-Xai, a capital.

A estrada rasgava paisagens verdejantes e cheias de água. Campos de arroz, plantações de bananeiras, milho, mangueiras e outras culturas compunham o cenário de uma forma harmoniosa e bela.

De repente, quando conduzia admirando a paisagem e as aldeias que ia atravessando, numa subida, vejo subitamente um moçambicano que vinha de bicicleta em sentido contrário e totalmente fora de mão. Páro imediatamente o carro e nem tenho tempo de buzinar, o dito ciclista que vinha a aproveitar a descida, ao ver o carro, atrapalha-se e vem violentamente embater na frente do carro voando por cima do capot e estatelando-se no meio do chão.

Saio do carro preocupado com o estado de saúde do moçambicano e depressa percebo que está bem apenas com uma pequena ferida superficial no joelho. Entretanto vou ver o estado em que o carro tinha ficado e vejo a grelha e o capot amachucados pela bicicleta e pelo corpo.

Depressa percebo que não há policia a quem me queixar, o dito ciclista nao teria dinheiro para me pagar fosse o que fosse dos estragos e digo-lhe zangado que ele tinha que ter atenção quando andava de bicicleta. Agora eu tinha que arcar com o prejuízo causado pela sua negligência.

Ele olha para mim e sente-se ainda no direito de me pedir dinheiro para tratar do joelho e de outras maleitas que entretanto ja se dispunha a enumerar, sem qualquer tipo de sentimento de culpa ou de responsabilidade pelos seus actos.

Que parasita, Irra!

sexta-feira, fevereiro 13, 2009

Retratos 30


O povo moçambicano é um povo extremamente critico de si próprio. Consideram-se habilidosos na fala e andam sempre a desenvolver esquemas para ver se tiram beneficios com o menor esforço possivel. A cultura do "estou a pidi". A conclusão não é minha, surge das conversas e das conclusões que eles próprios tiram da sua autoanálise.
Neste aspecto o consenso dos moçambicanos parece ser geral. Tudo se critica, mas alguém que se chegue à frente e faça. Nessa altura, os mais altos olham para fora à espera que alguém apoie a causa.
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