segunda-feira, abril 25, 2005

Eduardo Gageiro

Entrevista a Eduardo Gageiro
“Os meus ideais ficaram marcados no meu trabalho”
Aos 68 anos, Eduardo Antunes Gageiro assume-se como um fotógrafo que sempre procurou a diferença e a ruptura com o socialmente instituído.
Nascido em Sacavém no ano de 1935, Eduardo Gageiro publicou a sua primeira fotografia aos 12 anos, em 1947, no “Diário de Notícias”, e passados dez anos iniciou-se na profissão de repórter fotográfico, no “Diário Ilustrado”. Gageiro trabalhou nas publicações “O Século Ilustrado”, “Eva”, “Almanaque” e “Match Magazine”, foi editor da revista “Sábado” e colaborou com a delegação portuguesa da Associated Press, a Companhia Nacional de Bailado e a Presidência da República. Galardoado com diversos prémios um pouco por todo o mundo, Eduardo Gageiro é actualmente fotojornalista freelance e trabalha regularmente para a Assembleia da República.
Em 2004 foi condecorado com o título de Comendador da Ordem do Infante D. Henrique pelo Presidente da República, Jorge Sampaio, na cerimónia do 10 de Junho realizada em Bragança.
De que forma surge a fotografia na sua vida?
O meu pai tinha um pequeno estabelecimento comercial em frente à antiga Fábrica da Loiça de Sacavém e eu, ainda muito novo, aprendi a conviver com os operários da fábrica.
A partir de certa altura, o meu pai decidiu que a minha progressão profissional deveria de passar pela própria fábrica.
Primeiro fui paquete e depois empregado de escritório neste enorme complexo industrial mas, como é óbvio, devo ter sido o pior empregado de escritório do mundo, pois não tinha aptidão para a profissão.
Mas a verdade é que foi esse facto que me marcou toda a vida: a partir dos doze, treze anos, comecei a ganhar sensibilidade para determinados factos, como por exemplo ver, à saída da fábrica, os seus antigos operários a pedirem esmola. Essa visão marcou-me e, como o meu irmão Armando tinha uma pequena máquina fotográfica de plástico, que felizmente ainda guardo de recordação, iniciei-me na fotografia tentando registar os rostos, os olhares e as expressões de toda essa miséria social.
Mais tarde, alguns amigos emprestaram-me melhores máquinas fotográficas e, com a ajuda de alguns colegas que me iam dando algumas dicas a nível estético e técnico que me fizeram evoluir bastante.
Embora seja um autodidacta, penso que cedo mostrei que tinha alguma qualidade, já que ia conseguindo registar os momentos certos e captando os olhares mais profundos de uma determinada situação.
Como avalia a fotografia portuguesa dos anos 50?
Nessa altura estava muito na moda a chamada “fotografia de salão”, muito rebuscada, onde perdurava o pôr do Sol, as paisagens idílicas, entre outras. Sem ter noção disso, penso que fui fazendo uma ruptura com esse quadro social instituído. Talvez por isso mesmo, a partir dos dezasseis anos comecei a entrar em concursos de fotografia e ganhei imensos prémios a nível nacional e internacional. O primeiro prémio que ganhei, em 1955, foi num concurso organizado pelo Sindicato dos Empregados de Escritório do Distrito de Lisboa. Escusado será dizer que causei sensação devido à minha tenra idade.
Começou então o fotojornalismo...
É verdade. Também por essa altura comecei a trabalhar para uma revista de Vila Franca de Xira chamada Vida Ribatejana. Como tinha a tal imagem de marca um pouco diferente dos fotógrafos da altura, tive muita aceitação e, em 1957, fui trabalhar para o Diário Ilustrado.
Como não tinha grande experiência, comecei por trabalhar no laboratório e, só mais tarde, é que comecei a ser requisitado para fazer trabalhos de entrevistas onde me esmerei para mostrar serviço. Algum tempo depois havia jornalistas que já me escolhiam preferencialmente a mim para fazer alguns trabalhos. A partir daí, com altos e baixos, não mais parei e a fotografia e o fotojornalismo acompanharam-me ao longo de toda a minha vida.
Com o 25 de Abril aparece o Eduardo Gageiro mais institucional: o fotógrafo oficial da Presidência da República e da Assembleia da República. Como é que conseguiu ligar a sua irreverência profissional às regras rígidas da fotografia protocolar?
Depois da Revolução convidaram me para fazer fotografias para um catálogo oficial da Assembleia da República. As pessoas, nessa altura, já me conheciam bem, especialmente pelo trabalho que fiz durante a própria revolução. Mais tarde, necessitaram de um fotógrafo para determinadas sessões parlamentares mais importantes, e foi daí que veio o convite para trabalhar para esse órgão do Poder Central. Era um trabalho de “bate-chapas”, que não fazia com grande prazer, embora fosse necessário do ponto de vista financeiro. Fui ficando e só agora, com o Governo actual, é que prescindiram dos meus serviços e foram contratar o fotógrafo oficial do partido do Governo.
Sacavém e a Fábrica da Loiça. Duas imagens marcantes para si...
A fábrica hoje já não me diz nada. São apenas recordações de um tempo diferente, e só tenho pena de tudo ter acabado da forma como foi, com dramas familiares de milhares de pessoas. Continuo a falar com antigos trabalhadores, e tratam-me sempre com grande carinho, pois recordam-se dos bons tempos que passámos. Quanto à cidade, embora não seja muito bela e se tenha transformado num dormitório de Lisboa, é a minha cidade. Tem um museu lindíssimo, uma frente ribeirinha que, infelizmente, se continua a degradar, mas mantém alguns encantos, principalmente para as pessoas que aqui nasceram e foram criadas.
Embora em algumas alturas da minha vida, principalmente quando trabalhei no Século Ilustrado e na Presidência da República, não tenha tido muito tempo disponível, penso que ao longo dos últimos cinquenta anos, fui fotografando a cidade e as suas gentes de uma forma contínua.
Num “flash” da sua memória o 25 de Abril é o seu grande momento?
É o mais importante, quer a nível profissional, quer a nível pessoal. Até aí sempre tive medo de morrer sem ver esse dia e fiquei com a sensação que, depois da Revolução, poderia morrer feliz. É claro que, para mim, que vivi os momentos mais importantes ao lado do meu amigo Salgueiro Maia, o 25 de Abril teve um impacto tremendo. Fiz algumas fotos marcantes, como aquela em que na sede da PIDE o soldado retira a fotografia do Salazar, e estive presente nos momentos mais dramáticos, como o encontro das tropas no Terreiro do Paço.
Tive a felicidade de ter boas informações e depois a coragem de estar presente. Nestas condições o importante é não ter muito medo, pois algum todos têm, e o factor sorte também é decisivo. Depois é saber aproveitar e viver o momento.
Qual a fotografia mais marcante da sua vida?
Tenho algumas fotografias importantes, como uma que tirei aquando da tomada de reféns durante os Jogos Olímpicos de Munique, em 1972, ou aquela na sede da PIDE, que já referi.
Se tivesse de escolher alguma, talvez optasse por uma em que o Salgueiro Maia cerra os dentes e morde o lábio e que foi tirada na altura em que a tropas de Cavalaria 7, fiéis ao Governo, optam por aderir à Revolução. Mais tarde ele disse-me que esse foi o momento em que se apercebeu que a Revolução triunfara.
É um saudosista ou procura acompanhar o desenvolvimento?
Tenho alguma dificuldade de aderir ao digital, em termos de fotografia, porque gosto muito do cheiro do laboratório. Essa continua a ser uma paixão. No entanto, como autodidacta que sempre fui, a inovação e a modernidade fazem parte da minha maneira de ser. Tento sempre procurar e acompanhar a criação e a novidade. Tive uma vida cheia de emoções, guardo em minha casa um espólio assinalável que mais tarde será entregue ao Museu da Cerâmica de Sacavém, mas não me vejo como um saudosista.

25 de Abril

Foto de Eduardo Gageiro
Hoje é incontornável o nome de Eduardo Gageiro. Em 25 de Abril de 1974, Gageiro teve a noção do sentido da história e testemunhou os acontecimentos mais importantes que levaram ao derrube da ditadura eternizando-os com a sua inseparável máquina fotográfica. Viveu os acontecimentos da revolução com a paixão dos poetas tendo acompanhado e registado o ritmo da história.
Todavia, antes do 25 de Abril já Gageiro tinha fixado na sua objectiva a dor e os danos provocados aos portugueses pela ditadura. A miséria, a fome e a tristeza de um povo estão artisticamente retratadas em célebres fotos suas. Gageiro é considerado o fotógrafo de Abril mas o seu trabalho já havia começado muito antes.

sábado, abril 23, 2005

Dia Mundial do Livro


Foto de Luís Olival
"Foi logo na montra da livraria que descobriste a capa com o título que procuravas. Atrás desta pista visual, lá foste abrindo caminho pela loja dentro através da barreira cerrada dos Livros Que Não Leste, que de cenho franzido te olhavam das mesas e das estantes procurando intimidar-te. Mas tu sabes que não te deves deixar assustar, que no meio deles se estendem por hectares e hectares os Livros Que Podes Passar Sem Ler, os Livros Feitos Para Outros Usos Para Além Da Leitura, os Livros Já Lidos Sem Ser Preciso Sequer Abri-los Por Pertencerem À Categoria Do Já Lido Ainda Antes De Ser Escrito. E assim transpões a primeira muralha de baluartes e cai-te em cima a infantaria dos Livros Que Se Tivesses Mais Vidas Para Viver Certamente Lerias Também De Bom Grado Mas Infelizmente Os Dias Que Tens Para Viver São Os Que Tens Contados. Com um movimento rápido passas por cima deles e vais parar ao meio das falanges dos Livros Que Tens Intenção De Ler Mas Antes Deverias Ler Outros, dos Livros Demasiado Caros Que Podes Esperar Comprar Quando Forem Vendidos Em Saldo, dos Livros Idem Idem Aspas Aspas Quando Forem Reeditados Em Formato De Bolso, dos Livros Que Podes Pedir A Alguém Que Te Empreste e dos Livros Que Todos Leram E Portanto É Quase Como Se Também Os Tivesses Lido. Escapando a estes assaltos diante das torres de reduto, onde se te opõem resistência
os Livros Que Há Muito Programaste Ler,
os Livros Que Há Anos Procuravas Sem Os Encontrares,
os Livros Que Tratam De Alguma Coisa De Que Te Ocupas Neste Momento,
os Livros Que Queres Ter Para Estarem À Mão Em Qualquer Circunstância,
os Livros Que Poderias Pôr De Lado Para Leres Se Calhar Este Verão,
os Livros Que Te Faltam Para Pores Ao Lado De Outros Livros Na Tua Estante,
os Livros Que Te Inspiram Uma Curiosidade Repentina, Frenética E Não Claramente Justificada.
E lá conseguiste reduzir o número ilimitado das forças em campo a um conjunto sem dúvida ainda muito grande mas já calculável num número finito, mesmo que este relativo alívio seja atacado pelas emboscadas dos Livros Lidos Há Tanto Tempo Que Já Seria Altura De Voltar A Lê-los e dos Livros Que Dizes Que Leste e Seria ALtura De Te Decidires A Lê-los Mesmo."
Italo Calvino, Se Numa Noite de Inverno Um Viajante

sexta-feira, abril 22, 2005

Intimidades 05

Somos um país de contradições. Por um lado somos dos povos que melhor aceitam e aderem ao novo, às novas tecnologias, como o cartão electrónico e o telefone móvel. Temos mesmo sede de possuir o último grito, que na semana seguinte não passa de um som perdido no meio de outros tantos e no mês seguinte um leve murmúrio. Este espírito aparentemente aberto à novidade material é toldado pelo conservadorismo profundo que advém da fé no que toca às questões sociais. Se é verdade que a maioria dos portugueses encara a sexualidade já como algo que deve ser livre, ainda tem muitos preconceitos em questões como o aborto e a homosexualidade. A Espanha acabou de dar ontem um passo em frente no respeito pelas diferenças e pela liberdade de escolha. E nós?

quinta-feira, abril 21, 2005

quarta-feira, abril 20, 2005

Social 09

Foto de José Esteves
Parece que a doutrina social da igreja vai continuar aprisionada à ortodoxia. Teremos mais do mesmo, um papa firme nas questões do casamento dos padres e da sexualidade. Ratzinger, um nome que se antevê não deixará saudades aos sectores moderados da igreja.

sábado, abril 16, 2005

Retratos 06

Imagens de África, da terra-mãe, onde o tempo pára e a natureza envolve os corpos com um silêncio tranquilo, exaltando os sentidos, enchendo a alma.

domingo, abril 03, 2005

Papa João Paulo II

Foto de José Luís Mendes

Morreu o Papa João Paulo II. Um homem que representava a crença predominante do mundo ocidental. Um homem que no seu pontificado tentou e lançou as bases de diálogo e reconciliação com outras culturas e crenças religiosas, um homem que soube ser um diplomata e nessa diplomacia tentou fortalecer a importância da igreja católica.
Se é verdade que do ponto de vista político soube fazer pontes com outras civilizações, é também verdade que do ponto de vista da doutrina católica foi um homem conservador. Não soube/conseguiu/quis que a igreja se adaptasse às novas realidades sociais e foi incapaz de promover novas respostas a questões sensíveis, nomeadamente o papel da mulher na sociedade e na igreja, o sacerdócio e os os métodos anticoncepcionais.

sábado, abril 02, 2005

Intimidades 03

Foto de Luís Ribeiro

Biografia 01 - Fernando Lemos


Fernando Lemos nasceu em Lisboa, a 03 de maio de 1926, na Rua do Sol ao Rato. Cursou a Escola António Arroio e a Sociedade Nacional de Belas-Artes.

Fui estudante, serralheiro, marceneiro, estofador, impressor de litografia, desenhador, publicitário, professor, pintor, fotógrafo, tocador de gaita, emigrante, exilado, director de museu, assessor de ministros, pesquisador, jornalista, poeta, júri de concursos, conselheiro de pinacotecas, comissário de eventos internacionais, designer de feiras industriais, cenógrafo, pai de filhos, bolseiro, e tenho duas pátrias, uma que me fez e outra que ajudo a fazer. Como se vê, sou mais um português à procura de coisa melhor. (Lemos: 1994)


Iniciada em Lisboa, a carreira artística de Fernando Lemos desenvolve-se, sobretudo, na área da pintura e do desenho. Tem hoje trabalhos expostos em museus e coleções particulares no Brasil, em Portugal, Espanha, Suíça, Polónia, França, Estados Unidos, Japão, Holanda, Argentina. Trabalhou, ou trabalha, também com tapeçaria, pastilha vidrada, vitrais, azulejos e esculturas em ferro; e ainda é fotógrafo e poeta.
Em pleno período salazarista e depois da provocatória exposição surrealista do Chiado, em que participou, resolve emigrar para o Brasil, onde se junta ao grupo dos exilados, vindo posteriormente a ser proibido de reentrar em Portugal, uma situação que se manteve até a Revolução de Abril.
O material fotográfico exposto em 1952 não representava, todavia, a totalidade da produção realizada em quatro anos. Parte de material foi apresentada, em exposições individuais ou coletivas, no Rio de Janeiro (1953), São Paulo (1968), Lisboa (1982), Montreal (1983) e Paris (1992). De 20 de julho a 9 de outubro de 1994, as fotografias foram expostas novamente em Lisboa, e reunidas num catálogo individual, composto por 113 peças, das quais mais de 50 % são retratos de pessoas ligadas directa ou indirectamente à nata da intelectualidade portuguesa de então; e, como em Portugal proliferam os poetas, são estes os mais fotografados.
Pinturas, fotografias e desenhos do corpo humano são fotografados, persistindo na busca indirecta dos corpos, reconhecidos na produção simbólica de outrem, como em “Mão de sombra”, “Luz do olhar”, “Banho de sol” ou “Espreitando o quadro de Moniz Pereira”, que é a fotografia da pintura das costas de uma mulher nua, e peça inicial de uma série de onze belíssimos nus, anónimos todos, alguns conseguidos através dos recursos – ou da falta deles, o que naturalmente estimula a criatividade – da antiga câmara Flexaret. Em “Movimento”, “Nu lento”, Nudez dança”, “Colagem” e “Gesto emoldurado”, vemos o produto final de um processo descrito por Fernando Lemos nos seguintes termos:
As experiências feitas na duplicidade da imagem fotografada, cujos resultados são normalmente considerados como acidente devido à batida de uma foto sobre outra, foram no nosso caso e aí expostas, intencionais. A máquina usada na época, uma Flexaret, não era automática. Isso permitia tirar partido do espaço de um rolo de 12 módulos de 6 x 6, imprimindo-lhe várias imagens com combinações programadas, conscientes e, ao final, obter várias dezenas de opções para imprimir cópias ampliadas de detalhes que se tornavam entidades. Não se trata então de sobreposição de negativos [...]. (Lemos: 1994)

Reconhece-se aqui o emprego dos recursos da sobreposição (realizada através de dupla exposição), e, em menor número, o da imagem em negativo ou a intervenção sobre cópia. O abandono de uma preocupação realista dá-se através da busca de uma linguagem centrada nos recursos do suporte. Ao mesmo tempo, a produção de Fernando Lemos está fortemente influenciada pela elaboração de uma atmosfera surrealista, em que a luz é trabalhada com eficiência na construção de um espaço irreal.
Após o primeiro impulso do automatismo, [...] as fotos que estão expostas, passaram também a ser dirigidas, controladas, programadas. Também nessa época, a colagem, sistema de emprestar a certas imagens já estabelecidas nalgum suporte a capacidade de adesão a outras sobre outros suportes, ocupou muito do nosso cuidado nas experiências. E, finalmente, a ocultação (não confundir com ocultismo) onde, por exemplo, a tinta da china se derrama coerente, desrespeitando as imagens já impressas, ora saqueando, ora desmistificando, ora resgatando o universo irónico das semelhanças e/ou das diferenças, ora na recriatividade de eliminar redundâncias num retracto, reduzindo-o ao que nele era achado essencial. (Lemos: 1994)

Fonte:triplov.com

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